Abstract:
RESUMO: Os mangues compõem um ecossistema complexo e heterogêneo detentor de relevância ecológica, social e econômica. No entanto, estudos acerca das espécies e a estrutura ecológica para os manguezais ocorrentes na Área de Proteção Ambiental do Delta do rio Parnaíba são incipientes. Assim, objetivou-se caracterizar a estrutura, composição florística e ecológica de quatro bosques de manguezal em áreas regeneradas e conservadas do Delta do rio Parnaíba, Maranhão, nos municípios de Araioses e Água Doce, no total de 1,2 ha, entre fevereiro de 2017 e setembro de 2019. Os dados foram obtidos através de coletas de material botânico para análises taxonômico-morfométricos da forma foliar das espécies de Avicennia, dados fitossociológicos de biomassa e de sequestro de carbono dos bosques de mangue. A forma da folha é considerada diagnóstico para determinar as espécies Avicennia germinans e A. schaueriana foi investigada em sete populações dos quatro bosques usando análise elíptica de Fourier de 627 folhas para obter sete variáveis de forma. Os principais tratam da largura relativa, a forma da base, a transição da forma de ovada até obovada. A forma foliar foi estatisticamente diferente nas duas espécies, mas só discrimináveis em bosques conservadas e altas. Em A. germinans a variação foi maior, de elíptica a ovada, com base aguda e ápice variando de agudo a acuminado, enquanto em A. schaueriana são obovadas com base atenuada e ápice arredondado. A largura relativa e a forma da base pesaram mais como caracteres de diferenciação entre as espécies e as folhas foram significativamente menores em A. schaueriana. Em A. germinans, as folhas tornaram-se mais ovadas com o aumento do tamanho na floresta conservada. Os táxons vernaculares siriba branca e siriba preta são inconsistentes com espécies científicas, mas apresentam formas de folhas significativamente diferentes em algumas populações. Para a florística e fitossociologia, dentro de cada dos quatro bosques de mangue, foram alocadas 30 parcelas múltiplas de forma sistemática 10 x 10 m cada uma, totalizando 1.2 ha total. A circunferência (altura de peito) e altura de toda árvore com altura igual ou superior a 1,30 m foram medidas e calculados os valores dos parâmetros fitossociológicos. Biomassa foi estimada usando equações alométricas já publicadas. Propriedades químicas e físicas de amostras do solo de cada área e da água dos rios próximos foram analisadas. O perfil climatológico para a região, analisado utilizando dados entre 1998 e 2018 se caracteriza por dois períodos bem definidos, seco (junho a dezembro) e chuvoso (janeiro a maio). As quatro áreas se apresentaram como distintos na estrutura e a distribuição das espécies, com maior desenvolvimento nas áreas conservadas. Foram registradas 2.636 árvores das espécies Laguncularia racemosa (1.276 indivíduos, Combretaceae), Rhizophora mangle (925 indivíduos, Rhizophoraceae), Avicennia schaueriana (264 indivíduos, Acanthaceae), Avicennia germinans (161 indivíduos, Acanthaceae) e Conocarpus erectus (10 indivíduos, Combretaceae). Avicennia schaueriana foi registrada pela primeira vez para a região deltaica. Os solos e a água dos rios próximos apresentaram perfis químicos e físicos diferentes. A área conservada em Araioses, quase exclusivamente composta de R. mangle, apresentou maior altura (média 31,7 m, máx. 45.0 m), diâmetro (DAP médio 24.4 cm) e biomassa (317.1 Mg/ha) A área em regeneração em Araioses (recuperação por 25 anos) se apresentou como a maior em diversidade florística (5 espécies) e densidade, mas o menor em altura, diametro e biomassa. Nas duas áreas de Água Doce, a área em regeneração (recuperação por 50 anos), havia mais semelhaça na estrutura e na florística, sendo compostas de R. mangle e Avicennia spp. O principal estoque de biomassa é retido nos bosques mais altos. As quatro áreas subestimam a diversidade de tipos de manguezal do Delta. Maiores estudos são necessários para um mapeamento mais adequada, inclusive estudos da fragmentação dos manguezais, para ajudar no monitoramento em larga escala da deterioração dos ecossistemas de mangues. Verificou-se que as duas espécies de Avicennia apresentam número considerável de estudos em termos prospectivos. Os EUA, seguido do Brasil, possuem os maiores números de estudos relacionados, iniciados na década de 1980, sendo estes em maior número pertencentes a área de Ciências Ambientais, o que corrobora com os dados aqui apresentados. Visto a importância do ecossistema manguezal, a divulgação dos resultados constituirá em uma alternativa para que a população e os órgãos ambientais possam utilizá-los como parâmetros, visto a necessidade de dados de natureza ecológica para a região, bem como demais estudos da ordem etnotaxonômicas e biologia molecular. Diversos estudos foram publicados sobre sequestro de carbono em manguezais (Web of Science=400 e Scopus=408), com número crescente a partir de 2011, que incluíam: avaliação de produtividade, quantificação de estoque de carbono, influencia de fatores abióticos e, no caso de patentes, melhoramento da capacidade de fixação de carbono em manguezais. Conclui-se que as preocupações globais com as emissões de CO2 e a busca por fontes para seu armazenamento na superfície terrestre tem colocado os manguezais em posição de destaque. O estoque de carbono vivo acima do solo for estimado a partir de valores para a biomassa, nos quatro bosques. Os valores obtidos para o bosque mais alto na Ilha dos Poldros são parecidos aos já publicados para bosques de mangue em regiões equatoriais da Amazônia oriental brasileira e Gabão na África centro-oeste. Dado a diferença climática da região estudada, que sofre uma época seca anual bem marcada de 5 a 6 meses. Os resultados do estudo indicam a heterogeneidade no estoque de biomassa e de carbono a ser esperada em setores diferentes do Delta e destacam a necessidade para amostragens mais amplas para obter estimativas mais exatas. Para os fins de conservação, o estudo mostra que a porção do carbono e biomassa vivos acima do solo é muito maior nos bosques de mangue mais altos. O Delta do Parnaíba, tanto por incluir uma das maiores áreas protegidas de manguezal do Brasil, como por estar ainda em condição relativamente intacta e com proteção legal estabelecida sobre toda sua extensão, oferece um quadro favorável para estudos de maior escala e maior intensidade destas questões, importantes para sua manutenção como recurso local, regional e nacional.
ABSTRACT: Mangroves comprise a complex and heterogeneous ecosystem of great ecological, social and economic importance. Despite this, scientific studies of the species and ecological structure of the mangrove forests of the Environmental Protection Area Delta do Parnaíba are still in an early phase. The present study aimed to characterize the structure, floristic composition and ecology of four areas of conserved and regenerating mangrove forest in the Parnaíba Delta, Maranhão, in the municipalities of Araioses and Água Doce, making up a total area of 1.2 ha, based on fieldwork carried out between February 2017 and September 2019. The data were gathered from field investigations for taxonomic-morphometric analysis of leaf shape in species of Avicennia, data for phytosociological analysis, and for estimation of carbon stocks. Leaf shape, considered useful for identifying the species Avicennia germinans and A. schaueriana, was studied in seven populations from the four areas using elliptic Fourier analysis of 627 leaves to obtain seven shape variables. The major variables expressed relative width, base shape and the shape transition from ovate to obovate. Leaf shape was statistically different in the two species but they could only be reliably discriminated in tall conserved forest. Shape variation was greater in A. germinans; typically they are from elliptic to ovate with acute base and apex varying from acute to acuminate, while in A. schaueriana the leaves are typically obovate with attenuate base and rounded apex. Relative width and base shape are the most important differentiating shape features between the species, and the leaves are significantly smaller in A. schaueriana. In A. germinans the leaves become more ovate with greater size in conserved forest. The vernacular taxa siriba branca and siriba preta are inconsistent with the scientific species, but showed significantly different leaf shapes in some populations. For the floristic and phytosociological survey, within each of the four sample areas, 30 multiple plots, each 10 x 10 m, were systematically allocated, totalling 1.2 ha. Circumference at breast height (CBH) and height of all individual trees equal or greater than 1.30 m in height were measured, and the usual phytosociological parameters were then calculated. Biomass was estimated from published allometric equations. Chemical and physical properties of the soils of each sample area and of the adjacent water bodies were analysed. The climate of the study region, using historical monthly averages of precipitation recorded between 1998-2018 showed two well-defined annual seasons, dry (June to December) and rainy (January to May). The structural parameters and species composition varied among the four areas, with the greatest development in conserved areas. 2636 individual trees were recorded in three families, four genera and five species: Laguncularia racemosa (1276 individuals, Combretaceae), Rhizophora mangle (925 individuals, Rhizophoraceae), Avicennia schaueriana (264 individuals, Acanthaceae), Avicennia germinans (161 individuals, Acanthaceae) and Conocarpus erectus (10 individuals, Combretaceae). Avicennia schaueriana was recorded for the first time in the Delta region. Soil and water properties were distinct among the four areas. The conserved area in Araioses, almost exclusively composed of R. mangle, had the greatest height (mean 31.7 m, max. 45.0 m), diameter (mean DBH 24.4.cm) and biomass (317.1 Mg/ha). The 25-year regenerating area in Araioses had the greatest floristic diversity (5 species) and density, but was the smallest in height, diameter and biomass. The two areas in Água Doce, the regenerating area in recuperation for 50 years, were more similar in structure and floristics, composed of R. mangle and Avicennia spp. The tallest mangrove forest holds the greater part of the mangrove biomass. Although diverse, the four areas do not represent the full mangrove diversity of the Delta. Further studies are needed to provide adequate mapping, and also studies of forest fragmentation to help large scale monitoring of the deterioration of the mangrove ecosystem, given the lack of this kind of data for the region. The study verified that there are is a considerable number of published studies on the two species of Avicennia. The USA, followed by Brazil, has produced the greatest number since 1980, most being in the subject area of environmental science. Given the importance of the mangrove ecosystem the dissemination of results is important for the use of the population and environmental bodies as standards, in view of the need for ecological data in the region as well as new studies on ethnobiology and molecular biology. A range of studies have been published on carbon sequestration in mangroves (Web of Science=400 e Scopus=408), with numbers increasing since 2011, and they include topics such as productivity evaluation, quantification of carbon stocks, influence of abiotic factors, and in the case of patents, improvement in the carbon-fixing capacity in mangroves. These results show that global concern over CO2 emissions and the search for terrestrial carbon storage sinks has focussed much attention on mangroves. Living above-ground carbon stocks were estimated from biomass estimates for the four mangrove study areas. The values obtained for the tallest forest area in the Ilha dos Poldros are similar to those published for mangroves in equatorial regions of eastern Brazilian Amazonia and for Gabon in west-central Africa, although the Delta experiences a well-marked 5-6 month dry season. The results indicate that a considerable heterogeneity is to be expected in different parts of the Delta and highlight the need for wider studies to obtain more exact estimates. For the purposes of conservation, the study confirms that most of the living above-ground carbon and biomass is held in the tallest mangrove forest. The Parnaíba Delta, both as one of the largest protected areas of mangrove in Brasil, and because it remains relatively intact, offers a very favourable situation for larger scale studies of the questions raised in the course of this study, which are important for the conservation of this magnificent local, regional and national natural resource.